Afinal, o que é esta tal de presença?

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Ilana Berenholc

texto originalmente escrito em 2018, reformulado para expressar como vejo o tema hoje

Há muitos anos, fiz um curso de comunicação com uma atriz. No primeiro exercício, ela ligou a filmadora e pediu para eu falar de improviso sobre cinema brasileiro, fazendo a melhor apresentação que eu pudesse.

Falei, falei, falei, tentando colocar em prática tudo aquilo que eu “sabia” sobre como me apresentar bem, até que o assunto esgotou – e, então, parei. Só que ela não. Me vi com a câmera ligada, com a ela olhando para mim com a expressão “pode continuar”.

Não sabia o que fazer. Confesso que perdi o rebolado. Foi, então, que comecei, realmente, a improvisar. Falei sem meu script mental, perdi a pose e, confesso, me diverti. Quando fomos assistir ao vídeo, tive uma das maiores surpresas da minha vida. No trecho inicial, em que eu acreditava estar arrasando, vi uma pessoa sem graça, desinteressante, monótona. Mas, no exato momento em que comecei a improvisar, havia outra Ilana na tela: carismática, brilhante e com presença. Uma Ilana que eu não conhecia até então.

Esta experiência desconstruiu tudo o que eu julgava que sabia. Naquele momento, entendi que ter o conhecimento sobre como me portar frente a uma câmera, como gesticular, sobre frases de impacto ou o jeito certo de olhar não eram suficientes para eu ter presença. Ela acontece num campo muito mais sutil.

Saí desse encontro decidida a investigar o que havia feito com que, de um segundo para o outro, o brilho tivesse aparecido. E, quem sabe, poder falar de forma tangível sobre algo que é, na verdade, intangível.

A primeira coisa que descobri é que presença existe quando nos sentimos bem na nossa própria pele. No momento em que relaxei da ideia que eu tinha que me apresentar bem, mostrei quem eu era. Isto tem a ver com caminhar pelo mundo aceitando o pacote todo: o nosso bom, o médio e o ruim. E, mais, entendendo que o nosso “não tão bom assim” não é motivo para que a gente não ocupe o nosso espaço.

A segunda descoberta é que estamos improvisando o tempo todo, mas vivendo na ilusão que temos o controle de como as coisas vão acontecer. Tem uma coisa incrível no improviso que é o se conectar com o aqui e agora para poder, justamente, lidar com o aqui e agora. Se estou prestando atenção ao que passa na minha cabeça, pronto, desconectei. E, quando desconecto, não estou mais aqui presente. Minha luz apaga.

A terceira descoberta na minha jornada veio mais tarde. Cada vez abraço mais a ideia de que não somos uma coisa tão definida ou fixa. Não existimos como conceitos. Nos manifestamos na ação. Ações envolvem contextos, pessoas, ambientes, humores, o que mostra o quão elásticos somos, já que cada combinação destes elementos nos convida a nos expressarmos de milhares de formas possíveis. Somos identidades em ação.

Para mim, não há fórmulas ou receitas sobre como ter presença. Diariamente, são lançados mais e mais livros que prometem receitas de sucesso. Não sou das pessoas que acreditam neles. Não acredito em “modelo vigente”. Acredito que cada um tem sua própria voz, mas muitas vezes falta encontrá-la. É quando a encontramos que passamos a nos comunicar e expressar de uma forma só nossa que faz com que os outros queiram nos ouvir. E, só assim, esvaziamos o mundo da mesmice.